quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Não há territórios pobres: há territórios sem projecto.

Foto publicada no blog Arronches em Notícias

“A Arqueologia é provavelmente a última profissão romântica”, citou Jorge de Oliveira

Agora a sua actividade desenvolve-se no Pego do Inferno, na margem esquerda da Ribeira de Abrilongo, freguesia da Esperança no concelho de Arronches.
Já são trinta e sete anos de arqueologia, obviamente que primeiro numa fase perfeitamente amadora, depois na fase já profissional, mas ao fim e ao cabo é uma vida inteira dedicada à arqueologia, da qual não me arrependo de facto. É como digo, uma experiência sempre interessante, sempre novas aventuras e descobertas. Amanhã mesmo iremos para a Igreja dos Mouros, em Arronches para acabar um trabalho, e espero no dia seguinte ir para outra gruta recentemente descoberta que é o Pego do Inferno, que é uma gruta interessantíssima virada para o lado de Espanha, ainda que naturalmente em território português mas cujo acesso só é praticável entrando primeiro em Espanha, passando a ribeira e depois entrando nessa gruta.
… A gruta é ampla, situa-se numa zona paradisíaca mas de muito difícil acesso. E os pré-históricos obviamente que conheciam a paisagem como ninguém, souberam escolher aquele recanto aberto nos quartzitos para criar um espaço de vivência. E é aí que se abre em diáclase esta gruta, que tem pinturas rupestres. Algo escondidas pelo negro de fumo, porque de facto foi um espaço continuamente ocupado.
… é possível ver pintura a vermelho (óxido de ferro naturalmente), com representações maioritariamente antropormóficas, portanto representações humanas muito esquemáticas, (pois já estamos na fase da arte esquemática) da fase pós glaciar; uma arte que é pintada pelos primeiros indivíduos que faziam agricultura e pastorícia neste Alentejo, que já tinham ultrapassado a fase realista da arte e já estão na esquemática, na antecâmara da escrita, dos caracteres, e portanto já estão a esquematizar a sua forma de comunicar; e lá estão representações humanas, outras algo vegetalistas também. Falta agora estudar com cuidado e tentar remover algum do negro do fumo para podermos perceber se se trata de uma capela sistina ou se não é nenhuma capela sistina, e é apenas um espaço com pinturas só de um lado, e não toda coberta. Como lhe digo o maior problema é o negro do fumo.
… Estamos perante um conjunto de arte rupestre enorme na freguesia da Esperança o maior centro de arte rupestre a sul do país, em que a Câmara de Arronches convidou-nos a nós (Universidade de Évora) para reabilitarmos os acessos aos outros abrigos com pinturas e no fim deste projecto, daqui a 3 anos, podermos abrir ao público um Centro de Interpretação da arte rupestre da Esperança que vai ser montado num antigo lagar de azeite que se manteve completo. Fica assim a memória da transformação da azeitona e paredes meias o Centro de Interpretação, bem perto da aldeia, onde as casas têm chaminés gostosas (como dizem os brasileiros) e com fachadas entre o azul e amarelo brilhando contra o branco. Um sítio lindíssimo.
(da entrevista do Professor Jorge de Oliveira ao Diário do Sul)